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Christine Tappolet e a “Teoria Receptiva das Emoções”: entre a percepção do valor e a construção da experiência / Christine Tappolet and the “Receptive Theory of Emotions”: between the perception of value and the construction of experience

(Versão em Português) 1. Contexto e enquadramento Christine Tappolet é uma das principais representantes do perceptualismo avaliativo, corrente que entende as emoções como uma forma de percepção de valores. A sua obra Philosophy of Emotion: A Contemporary Introduction (Routledge, 2022) traça o mapa das principais teorias filosóficas das emoções, e o artigo The Receptive Theory: A New Theory of Emotions ( Philosophies , 2023) representa a tentativa de aperfeiçoar e consolidar o seu próprio modelo teórico. Com esta “teoria receptiva”, Tappolet procura oferecer uma via intermédia entre dois polos que dominam o debate contemporâneo: por um lado, o universalismo biológico das emoções básicas (Ekman); por outro, o construcionismo psicológico de Lisa Feldman Barrett. A autora rejeita tanto a ideia de que as emoções são programas biológicos fixos como a noção de que são meras construções conceptuais e culturais. Em alternativa, propõe que as emoções sejam representações analógicas, não co...

O Cérebro Preditivo e a Ilusão do Agora: A Lição que Revoluciona o Livre-Arbítrio / The Predictive Brain and the Illusion of Now: The Lesson That Revolutionizes Free Will

 (Versão em Portugês) Lisa Feldman Barrett — a cientista que ensinou os tribunais a pensar o sentir Lisa Feldman Barrett é uma das mais influentes neurocientistas e psicólogas cognitivas do mundo contemporâneo. Professora da Northeastern University, investigadora do Massachusetts General Hospital e da Harvard Medical School, é membro da  National Academy of Sciences  dos Estados Unidos e autora de mais de 250 artigos científicos citados dezenas de milhares de vezes - um número que a coloca entre o 1% de cientistas mais citados globalmente. O seu trabalho influenciou decisivamente não apenas a neurociência, mas também o direito, a psicologia forense e a filosofia da mente. Em tribunais federais norte-americanos, o seu nome surge com frequência nas notas de rodapé de juízes e pareceres amicus curiae, em particular quando estão em causa a fiabilidade dos testemunhos emocionais, a avaliação de comportamentos impulsivos e a fronteira entre emoção e racionalidade na imputação p...

Portugal, o País do Respeitinho: Quando a Crítica É Crime

  “Em democracia, o poder não é para ser reverenciado, é para ser escrutinado.” I. A ironia da democracia punitiva Portugal continua a ser apontado como um dos países mais seguros e pacíficos do mundo. Mas no domínio da liberdade de expressão , o retrato é bem menos idílico. Segundo os dados oficiais do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) , o país encontra-se entre os dez Estados mais condenados da Europa por violar o artigo 10.º da Convenção Europeia dos Direitos Humanos , que protege o direito à liberdade de expressão. E há um padrão inquietante: as condenações portuguesas dizem demasiadas vezes respeito a críticas dirigidas a magistrados, procuradores ou instituições da Justiça . Ou seja, àqueles que, num Estado de Direito, deveriam ser os primeiros a aceitar o escrutínio público. II. Os números que envergonham uma democracia De acordo com os dados oficiais do TEDH compilados até 2025: Portugal ocupa o 8.º lugar no ranking europeu de violações do artigo 1...

O Cérebro Ideológico - quando a rigidez mental se torna crença - uma síntese crítica à obra de Leor Zmigrod (2025)

  Leor Zmigrod: da cognição à ideologia Leor Zmigrod é neurocientista e investigadora da Universidade de Cambridge. Estuda há mais de uma década a relação entre flexibilidade cognitiva, neurociência da ameaça e ideologias políticas . Os seus trabalhos têm sido publicados em revistas científicas de referência e integrados em relatórios sobre extremismo e polarização social. Em O Cérebro Ideológico (The Ideological Brain), Zmigrod sintetiza esse percurso de investigação e propõe uma ideia provocadora: a ideologia é menos uma questão de conteúdo e mais um estilo de pensamento . “Não é o que acreditamos que importa, mas como acreditamos.” A tese central é clara e sustentada: pessoas com menor flexibilidade cognitiva e maior intolerância à ambiguidade tendem a aderir mais facilmente a visões do mundo dogmáticas e dicotómicas, sejam políticas, religiosas ou morais. A ideologia, nesse sentido, é o espelho de um cérebro que prefere certezas . O livro baseia-se numa série notável de...

O Juiz e o Cérebro Preditivo: da Inteligência Emocional à Emoção Construída

“ A emoção não é uma reação, é uma construção. ” -  Lisa Feldman Barrett “ Cérebro e mente são inseparáveis: pensar e sentir são redes entrelaçadas. ” -  Luiz Pessoa “ Um juiz emocionalmente inteligente não é o que não sente, mas o que sabe o que sente. ” -  Terry A. Maroney “ Não somos seres racionais que sentem, mas seres emocionais que pensam. ” -  António Damásio I. Da inteligência emocional à neurociência do julgar Durante décadas, a “inteligência emocional” foi o conceito preferido para abordar a relação entre emoção e decisão. Terry Maroney , professora de Direito e investigadora em Vanderbilt, cristalizou essa ponte em The Emotionally Intelligent Judge , defendendo que a imparcialidade não se constrói contra a emoção, mas através da sua gestão consciente . Contudo, a ciência cognitiva deu um passo além. O que antes era um problema de self-control é hoje entendido, à luz da Theory of Constructed Emotion (Barrett) e do modelo do cérebro preditivo (...

O Cérebro que Julga Sentindo: Como Lisa Feldman Barrett Reconstruiu as Emoções e Desafiou os Tribunais em How Emotions Are Made

Lisa Feldman Barrett — a cientista que ensinou os tribunais a pensar o sentir Lisa Feldman Barrett é uma das mais influentes neurocientistas e psicólogas cognitivas do mundo contemporâneo. Professora da Northeastern University, investigadora do Massachusetts General Hospital e da Harvard Medical School, é membro da National Academy of Sciences dos Estados Unidos e autora de mais de 250 artigos científicos citados dezenas de milhares de vezes - um número que a coloca entre o 1% de cientistas mais citados globalmente. O seu trabalho influenciou decisivamente não apenas a neurociência, mas também o direito, a psicologia forense e a filosofia da mente. Em tribunais federais norte-americanos, o seu nome surge com frequência nas notas de rodapé de juízes e pareceres amicus curiae, em particular quando estão em causa a fiabilidade dos testemunhos emocionais, a avaliação de comportamentos impulsivos e a fronteira entre emoção e racionalidade na imputação penal. Juízes como Jed S. Rakoff - ...

O Mundo Misterioso da Memória — Charan Ranganath (2024) - Síntese crítica e implicações forenses

Nota biográfica Charan Ranganath é professor de Psicologia e Neurociência Cognitiva na Universidade da Califórnia em Davis, onde dirige o Dynamic Memory Laboratory , um dos centros mais reputados na investigação sobre os mecanismos cerebrais da memória. O seu trabalho combina neuroimagem funcional, psicologia experimental e modelação computacional para compreender como o cérebro codifica, armazena e recupera experiências. Colabora com instituições como o National Institute of Mental Health e é autor de dezenas de artigos científicos nas revistas Nature Neuroscience , Neuron e PNAS , sendo hoje uma das principais autoridades mundiais no estudo da memória episódica. 1. A memória como processo dinâmico, não como arquivo Em O Mundo Misterioso da Memória ( Why We Remember , título original, 2024), Ranganath desconstrói um dos equívocos mais persistentes da cultura jurídica e popular: a ideia de que a memória humana funciona como um repositório estático, um “disco rígido” que armazena ...